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ALEKSANDER WAT
( Polônia )
Varsóvia, 1900 – Paris, 1967
É prosador, poeta, editor e tradutor.
São obras de sua lavra, entre outras, Bezrobotny Lucyfer (contos, 1927), Wiersze (poesia, 1957), Wiersze sró diziemno morkskie (poesia, 1962), e Mók wiek. Pamietnik mówiony (memórias, 1981).
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POESIA SEMPRE. Ano 15 Número 30 2008. Polônia. Editor Marco Lucchesi. Rio de Janeiro: Fundação Biblioteca Nacional, 2008. 178 p. No. 10 381
Exemplar da biblioteca de ANTONIO MIRANDA
Se a expressão “existe” deve ter algum sentido,
Então convém que se refira a algo a que seja possível voltar.
No entanto, não há volta. Tudo é uma só vez
e antes que o “existir” tenha começado já deixou de “existir”
(atenção: “tenha começado”, “deixou” são igualmente sem
fundamento),
e a alternância “é” e “não é” não é uma sequência no tempo,
ela acontece além do tempo — desde que “acontece”
possa se aplicar aqui.
Portanto
voltemos de novo
à ausência. Pois com ela estamos mais seguros.
Pois nós a criamos. Ela não depende
nem do que “é”, nem do que “não é”.
Como é bom voltar aos velhos conceitos desprezados!
(Obs. É corrente o sentido desse “voltemos”.
Assim por exemplo voltou
Ulisses para Penélope, para ela que sabe o segredo:
que é preciso tecer e desfiar. E de novo tecer e desfiar.)
Tradução inédita de MARCELO PIVA DED SOUZA
(Poema original sem título, em Poezje. Warsawa, Czytenik, 1997.)
Poeta
O poeta é aquele, pensei, que veio sem ser convidado
para o banquete dos Filistinos?
E colocou-se à cabeceira da mesa,
o cabelo feito um capacete,
oh, como domina a assembléia dos Filistinos armados!
Ele chega de partes onde nenhum deles esteve
e nunca estará.
Onde as coisas finais chocam-se
e fendem como montanhas glaciais
e afundam ou,
ou vão flutuando embora
ao encontro de novos nascimentos e pores do sol,
que nenhum deles verá.
Ele podia levar diante de si seu desprezo como duas tochas —
mas num olho incandesceu amor
e noutro fúria.
Ele podia, dos pássaros assados sobre travessa de ouro,
predizer-lhes seu triunfo, ou sua derrota. Derrota, muitas derrotas.
Ele podia gritar e com seu punho de pedra
partir suas mesas ao meio,
rasgar suas armaduras de cobre.
Porque veio sem se deixar convidar... Ou —
podia ele mesmo assumir a forma de uma cerceta branca
e com um só movimento das asas
voar embora, depois cair como pedra
nas águas negras
nas ondas escarlates
do Estige... Ou, ou
nas águas puras
e distante
da terra
natal
Tradução de ZBIGNNIEW WÓDKOWSKI (Com modificações:
Aproximações , Brasília/Lisboa/Cracóvia, n.4, 1990)
Vésperas em Notre-Dame
Entra na catedral ao crepúsculo de verão
quando tocam Bach: sois tranquille
sois tranquille, mon âme...
O coral dos vitrais, o luzir das coroas,
línguas chamejantes de cem mil velas
agitarão no ar aquele pólen de cor,
laicizado de maneira tão chã
pelos pintores pós-impressionistas...
Não, não é isso! A luz – Espírito Santo
irrompeu como tempestade através do vidro e do chumbo.
E quando se mistura com a harmonia de Bach,
suscita ano ar gamas de cores,
onde cada cor é fogo diferente,
éon sonoro nos prismas do fogo
coral das cores, como das chamas,
nuvem dos sons no fogo da catedral.
É fogo vivo. Renasce nele
a alma acossada. Fênix morta.
Sois tranquille, mon âme... Sei ruhig, mein´ Seel´,
sei ruhig
Tradução de ZBIGNIEW WÓDKOWSKI Com modificações:
Aproximações , Brasília/Lisboa/Cracóvia, n.4, 1990)
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Página publicada em maio de 2025.
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